50 anos: Lyudmila, a sniper que abateu 300+ nazistas

Há 50 anos, em 10 de outubro de 1974, falecia a franco-atiradora soviética Lyudmila Pavlichenko, heroína da Segunda Guerra Mundial. Lyudmila é considerada a franco-atiradora feminina mais bem sucedida da história. A ela são creditadas as mortes de 309 soldados nazistas, incluindo 36 snipers e mais de 100 oficiais.

Lyudmila Pavlichenko nasceu em 12 de julho de 1916, em Bila Tserkva, na Ucrânia, filha do militar Mikhail Ivanovich Belov e da professora Elena Trofimovna Belova. Seu pai participou ativamente do levante revolucionário de 1917 e era um veterano da Guerra Civil Russa. O sobrenome “Pavlichenko” foi incorporado após o breve casamento com Alexei Pavlichenko, que Lyudmila conheceu ainda na adolescência.

Em Kiev, Lyudmila conciliou os estudos com o trabalho na Fábrica do Arsenal. Dedicava seu tempo livre ao tiro esportivo e foi laureada com um diploma honorário por seu desempenho nas competições promovidas pela Osoaviakhim — organização do governo russo voltada a treinar a população civil em técnicas de defesa e conhecimentos militares. Em 1936, Lyudmila ingressou no curso de história da Universidade de Kiev.

Após o início da Segunda Guerra Mundial e a subsequente invasão da União Soviética por tropas da Alemanha nazista, Lyudmila se ofereceu como voluntária ao recrutamento do Exército Vermelho. Sua experiência com o manuseio de armas fez com fosse designada para a 25ª Divisão de Rifles, tornando-se uma das mais de 2.000 franco-atiradoras femininas que atuaram pelo Exército Vermelho durante o conflito.

Ainda em junho de 1941, após um rápido treinamento, Lyudmila foi enviada para enfrentar as tropas romenas nas florestas da Bessarábia. Em seguida, atuou na Batalha de Odessa, onde impressionou os oficiais com a sua destreza e precisão de seus tiros, causando 187 baixas às forças do Eixo. Os soviéticos, entretanto, foram forçados ao recuo, subjugados pela vantagem numérica das tropas inimigas.

Ferida no campo de batalha, Lyudmila acompanhou o comboio que se dirigiu a Sebastopol, um porto da Crimeia no Mar Negro. Em Sebastopol, foi promovida a sargento-mor e assumiu o comando de um esquadrão de atiradores, ficando responsável por selecionar e treinar os integrantes do grupo. Ela auxiliou na defesa de Sebastopol contra o cerco das tropas do Eixo, comandando os snipers das colinas de Mekenzi — e, mais uma vez, teve seu desempenho elogiado pelo Conselho Militar soviético.

Lyudmila foi condecorada e promovida ao posto de tenente. A franco-atiradora causou tantas baixas às tropas alemãs que o serviço de inteligência nazista incluiu seu nome em uma lista de alvos preferenciais e despachou missões especiais da SS para tentar assassiná-la. Ainda durante o Cerco de Sebastopol, Lyudmila se casou pela segunda vez com o soldado Alexei Kitzenko. O casamento durou pouco tempo: Alexei faleceu algumas semanas depois, vitimado por um ataque alemão.

Em junho de 1942, Lyudmila foi ferida em combate por um morteiro. O comando soviético mobilizou um submarino para evacuá-la até Novorossiysk, na região do Cáucaso, onde ela ficou internada. No hospital, a franco-atiradora recebeu a visita de Josef Stalin. Já recuperada, Lyudmila foi enviada junto com uma delegação de soldados soviéticos para uma visita aos Estados Unidos, em setembro de 1942.

Wikimedia Commons/Israel OzerskyLyudmila Pavlichenko retratada por Israel Ozersky em 1942
Wikimedia Commons/Israel Ozersky Lyudmila Pavlichenko retratada por Israel Ozersky em 1942

A viagem visava pressionar o governo norte-americano a intensificar seu esforço de guerra e abrir uma segunda frente de combate na Europa Ocidental. Nos Estados Unidos, Lyudmila e os demais membros da delegação se tornaram os primeiros cidadãos soviéticos a serem recebidos na Casa Branca. A franco-atiradora foi homenageada pelo presidente Franklin Roosevelt e saudada como heroína na Assembleia Internacional de Estudantes.

A convite da primeira dama, Eleanor Roosevelt, Lyudmila partiu por uma turnê pelos Estados Unidos, a fim de relatar suas experiências em combate. A jovem não escondeu sua frustração com a frivolidade da imprensa norte-americana, que insistia em perguntas sobre seu peso, o uso de maquiagem ou a aparência de seu uniforme.

Em certa ocasião, impaciente com as perguntas irrelevantes e sexistas dos jornalistas, retrucou: “Se vê que, para os americanos, o importante é se as mulheres vestem roupa íntima de seda por baixo do uniforme. Mas o significado verdadeiro da farda é algo que ainda precisam aprender”. Em Chicago, foi efusivamente aplaudida após um discurso em que exortou a plateia a apoiar a criação de uma segunda frente de combate aos nazistas: “Eu tenho 25 anos e já matei 309 invasores fascistas até o momento. Vocês não acham, senhores, que já se esconderam por muito tempo atrás das minhas costas?”, declarou.

Após a turnê pelos Estados Unidos, a delegação ainda visitou o Canadá e o Reino Unido. Em Toronto, Lyudmila foi presenteada pelos trabalhadores de uma fábrica de armas com um fuzil de trincheira Winchester 1897. Em Londres, foi recepcionada pelo primeiro-ministro Winston Churchill. A delegação retornou para a União Soviética em janeiro de 1943.

Lyudmila foi promovida ao posto de major e condecorada com a Estrela de Ouro, tornando-se oficialmente uma heroína da União Soviética. Ela também foi laureada por duas vezes com a Ordem de Lenin. Por determinação do alto comando do Exército Vermelho, a militar foi definitivamente afastada do campo de batalha, ocupando-se a partir de então da formação de novos franco-atiradores.

Com o fim da Segunda Guerra, Lyudmila concluiu seus estudos na Universidade de Kiev, graduando-se como historiadora. Atuou como assistente de pesquisas no Quartel-General da Marinha Soviética e ingressou no Comitê Soviético dos Veteranos de Guerra. Também tornou-se membra da Associação de Amizade com os Povos da África e do Sindicato dos Jornalistas da União Soviética.

A participação no conflito, entretanto, deixou marcas profundas pelo resto de sua vida. Lyudmila desenvolveu depressão, transtorno de estresse pós-traumático e dependência alcoólica. Ela faleceu em 10 de outubro de 1974, aos 58 anos de idade, vitimada por um derrame.

Lyudmila empresta seu nome a diversas ruas e escolas na antiga União Soviética. A sniper foi homenageada pelo cantor folk norte-americano Woody Guthrie com a canção “Miss Pavlichenko”. Sua trajetória também foi contada no filme biográfico “Batalha de Sevastopol“, lançado em 2015, que tem entre os pontos altos a dramatização de um diálogo entre a franco-atiradora e a primeira-dama dos Estados Unidos. Ao ser questionada por Eleanor Roosevelt sobre quantos homens havia matado, Lyudmila retrucou: “Não eram homens. Eram fascistas”.

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Edson Marcelo Caramelo

Administrador de Empresas formado pela Universidade Católica Dom Bosco, especialista em blogs, escritor e produtor de infoprodutos.

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